O processo de institucionalização do direito à língua: uma análise discursiva dos sentidos de línguas (co)oficiais em legislações municipais brasileiras

Abstract

O trabalho empreendido/realizado nessa pesquisa tem como objetivo uma análise discursiva das legislações que instituem línguas cooficiais no Brasil e dos (efeitos de) sentidos dessas línguas, por esse acontecimento, além de refletir sobre a compreensão dessas leis sobre línguas enquanto instrumentos linguísticos, no/do século XXI. E é a partir desse efeito de sentido que se busca refletir sobre a institucionalização da cooficialização de línguas no Brasil, pela relação de legitimação e institucionalização no percurso delineado por esse processo, discutindo a importância da autoria nesse gesto de direito à língua. Então, a partir da leitura pecheutiana foi possível propor esse gesto de pesquisa, essa forma de olhar a questão, portanto filia-se ao dispositivo teórico e analítico da Análise de Discurso de linha francesa, pelos trabalhos de Michel Pêcheux, na França, e de Eni Orlandi e seu grupo, no Brasil, como, também, aos estudos realizados sobre a História das Ideias Linguísticas – outra leitura, outro olhar teórico produziria uma caracterização diferente, um ingresso diferente a questão. Assim, compreende o indivíduo enquanto interpelado em sujeito pela ideologia, dada essas relações de força e poder nas questões de direito à língua das minorias, ao se tomar conhecimento desse processo de cooficialização no Brasil – que procura dar um status de oficialidade a outras línguas, que não são oficiais – surge o interesse por essa temática, pela convivência com as diferentes línguas existentes no município de Guajará-Mirim/RO, uma cidade nortista, amazônica, fronteiriça e de imigrantes, um lugar de línguas outras, de imbricações linguísticas, e ainda assim, um lugar onde não há língua cooficializada. Desta maneira, descrevem-se as condições de produção dos sentidos postos nessas questões de direitos e deveres, igualdades e diferenças, entre as línguas, em análise dos processos de cooficialização, garantidos/permitidos, ou não, por instrumentos jurídicos municipais. O corpus do trabalho é constituído por recortes de textos de legislações homologadas, publicadas e vigentes no Brasil, a partir do início do século XXI, que legislam sobre a cooficialização em território nacional, e são elas: Lei N.º 145 de 11 de dezembro de 2002, das línguas Nheengatu, Tukano e Baniwa no município de São Gabriel da Cachoeira/AM; Lei N.º 510 de 27 de junho de 2008, da Língua Pomerana no município de Laranja da Terra/ES; Lei N.º 211 de 04 de dezembro de 2014, das línguas Wapichana e Macuxi no município do Bonfim/RR. Pelas análises pode-se observar que há uma individualização dos sujeitos falantes de línguas outras, enquanto minorias, na qual não são deslocados sentidos, mas silenciada a resistência das minorias linguísticas – que está sendo determinada por essas práticas discursivas, que são ideológicas, de direitos humanos, por aparelhos do legislativo, do judiciário e do executivo. Essa resistência é silenciada no momento em que o Estado passa a positivar essas línguas outras. Resistência esta, que é igualmente constitutiva do ritual ideológico do assujeitamento desse sujeito falante de língua(s) outra(s).