Teotônio: a trajetória de uma comunidade ribeirinha afetada pela Hidrelétrica de Santo Antônio no Rio Madeira

Abstract

A construção das Usinas Hidrelétricas (UHE) Santo Antônio e Jirau no rio Madeira, em Porto Velho (RO), afetou milhares de ribeirinhos e comunidades, incluindo a Vila de Teotônio, um importante centro pesqueiro e turístico local. Nesse contexto, esses ribeirinhos tiveram suas formas de existir atingidas. Esta pesquisa analisou as trajetórias de vida e as mudanças na identidade dos moradores da Vila de Teotônio após a construção da UHE Santo Antônio, no rio Madeira. Para isso, aprofundou-se na compreensão da Amazônia como produto das relações humanas históricas (MARQUES, 2019): os territórios amazônicos são monopolizados (OLIVEIRA, 2010) para que suas áreas e demandas sejam direcionadas ao mercado internacional a partir da produção de commodities – dentre elas, a energia elétrica. Para discutir identidade e compreender os impactos causados aos modos de vida dos ribeirinhos de Teotônio pela construção da UHE, nos apoiamos nas premissas teóricas da psicologia histórico-cultural. Com base no pressuposto de que a identidade possui relação com o desenvolvimento psicológico, nos apoiamos em autores como Vygotski (2004), para quem personalidade e consciência são formadas e conhecidas originariamente das contradições presentes nas diferentes e complexas relações de classes. Conforme Beatón (2017), a formação de consciência do sujeito se dá nas vivências do mundo objetivo. Identidade, para Ciampa (1984), é produção coletiva, transformada em pessoal, a partir da atuação do sujeito no mundo objetivo; identidade significa ser quem se é. Conforme Montaño (2021), o sujeito se identifica com um determinado atributo ou situação e com outros indivíduos que apresentam as mesmas características. Assim, partindo das vivências, o sujeito passa a observar e ter a consciência de que sentido sua identidade carrega. A consciência e a vivência da identidade possibilitam que o sujeito se aproxime da luta antiopressiva. O ribeirinho é uma das identidades presentes na Amazônia, que se formou em seu percurso histórico; Vila de Teotônio é a materialização dessa forma de ocupação. Para compreender os impactos causados aos ribeirinhos de Teotônio, utilizou-se o método materialista histórico-dialético (MARTINS, 2006). Para coletar dados, foram realizadas cinco entrevistas semiestruturadas com sete participantes – entre moradores e ex-moradores da Vila de Teotônio e membros do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB). Para a construção dos dados, além das entrevistas, foram utilizados o diário de campo e a observação participante. Os dados analisados foram expostos nas discussões, efetivadas a partir de quatro categorias: o ribeirinho de Teotônio, seu território e origem; produção, lugar e identidade do ribeirinho de Teotônio; reorganização de identidade e as usinas hidrelétricas; a empresa, modus operandi de divisão da comunidade e as estratégias de resistências dos moradores. Considera-se que as UHE retiraram do ribeirinho sua autonomia de produção e relação com o território; diante de sua nova realidade e dos impactos causados ao bioma, o ribeirinho tenta se reestabelecer e continuar sua existência conforme a identidade historicamente construída.