Por uma escola que acolha as diferenças: relatos sobre a infância de jovens que não se identificam com a cultura heteronormativa

Abstract

O presente trabalho retrata as vivências escolares narradas por duas pessoas homoafetivas que, ao relatar as memórias da infância e adolescência, puderam destacar a influência da relação eu-outro que ocorreu no espaço da escola e serviu de elemento para construção da identidade deles. A fundamentação teórica foi construída a partir do diálogo sobre a história da sexualidade por Foucault (1999) e Silva (2016), o conceito de sociedade heteronormativa segundo Muniz (2017) e o modo como a religião tem interpretado a homoafetividade de acordo com Silva e Barbosa (2016) e estudo que retratam os impactos da cultura heteronormativa no processo de construção da identidade sexual de indivíduos que fazem parte do grupo LGBTQIA+ segundo Madureira; Branco (2007) e Lepre (2003). O percurso metodológico foi pautado na abordagem qualitativa e trata de uma pesquisa narraitva envolvendo o relato de dois homens gays. Para a produção das informações utilizamos a entrevista semiestruturada que ocorreu individualmente com cada um dos participantes deste estudo. A metodologia de análise das informações que foram geradas nas entrevistas foi os núcleos de significação de acordo com Aguiar e Ozella (2006). Como resultado foi possível identificar seis núcleos de significação, a saber:1) A construção da identidade que contrapõe aos padrões culturais; 2) Histórias da infância; 3) Relatos sobre religião; 4) A vida em família; 5) A vida com os amigos na escola; 6) Relatos sobre a experiências na escola. Em cada um desses núcleos podemos perceber que o cenário escolar foi o lócus predominante de vivências marcadas pela violência física, simbólica, emocional e psicológica que influenciaram na construção da identidade dos participantes da pesquisa. Essas violências foram expressas de forma recorrente e preponderante nas relações que ocorriam entre pares, ou seja,criança-criança e adolescente-adolescente. Os adultos, geralmente, não estavam implicados, ausentes e quando apresentavam posturas de acolhimento acabavam reforçando a cultura heteronormativa que pouco dialogava com as questões internas de construção da identidade de ambos os participantes. O que tornava a situação ainda mais complexa. Por outro lado, também foi possível perceber a presença de adultos no contexto escolar que conseguiram agir com respeito e acolhimento. Importante mencionar que a postura empática ocorreu mais nas escolas públicas, isso não quer dizer que não teve problemas, porém, no contexto da escola privada e de vertente religiosa as vivências de hostilidade, desrespeito e agressão foram invisibilizadas pelos pares ao apresentarem comportamentos de indiferença e apatia com a dor do outro. Destaca-se que as informações geradas nesse percurso investigativo mostraram que as escolas ainda não se impõem como um ambiente inclusivo com práticas de respeito e acolhimento da diferença, conforme está previsto nas Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais da Educação Básica no Brasil. Portanto, é urgente investir em formação continuada para os profissionais que atuam nas escolas que contemplem discussões que tratam sobre gênero e sexualidade, visando o combate à homofobia.